quarta-feira, 4 de março de 2015

Young: “Água não se economiza, se respeita”


O vereador Ricardo Young, líder do PPS, usou o Grande Expediente da Câmara na sessão plenária desta terça-feira (3/3) para chamar atenção para a questão da água e da necessidade de um olhar sistêmico sobre a preservação do meio ambiente.

Segundo o vereador, mais urgente do que a necessidade de economizarmos, é criarmos uma consciência de consideração da água, não apenas como um bem de consumo, mas “como se fosse uma pessoa da família”. 

Young aproveitou também para agradecer pelos trabalhos na Comissão de Saúde, já que, a partir de hoje, deixará essa Comissão para compor a Comissão de Trânsito, Transporte, Atividade Econômica, Turismo, Lazer e Gastronomia. Segue a íntegra do discurso e o documento usado pelo vereador para a sua exposição -  http://goo.gl/8x6nqX

“Como a maioria de vocês deve saber, eu sou um empresário de origem. No meio empresarial, a água há muito tempo não é encarada como um insumo de pouco valor. Principalmente para as indústrias ela é, muita vezes, a matéria prima principal e tratá-la com respeito é uma questão de garantia econômica da empresa.

Infelizmente esse pensamento que já é perene no meio empresarial precisou de uma crise como a que vivemos para emergir. A Câmara precisou que as torneiras literalmente secassem, que chegássemos ao estado que estamos para trazer o tema da água a tona. Temos projetos de grande qualidade parados na Casa há anos e a prova disso é que agora eles estão aparecendo. Mas o fato é que a situação em que a cidade se encontra agora foi meticulosamente talhada gestão após gestão.

Nesta primeira ilustração é possível ver como as áreas verdes do estado de São Paulo foram dissipadas ano após ano.

A falta de senso de pertencimento do homem em relação à natureza fez com que estupidamente pensássemos que poderíamos dissipar tudo e que o ambiente continuaria nos fornecendo aquilo que necessitamos. Mas, sem as ferramentas necessárias, a natureza simplesmente é incapaz disso. Sem verde não há água, não há ar puro e é uma pena que tenhamos demorado tanto para perceber algo tão óbvio, se é que já percebemos.

A cidade de São Paulo é a maior mancha urbana do continente e nossos índices de área verde são baixíssimos. Enquanto o recomendado é que as cidades tenham em média 12 metros quadrados de verde por pessoa, nós temos apenas 2,6 metros quadrados. A situação é ainda pior em alguns bairros, como a Mooca, onde esse número é de 0,35 metros quadrados. Devem ser as plantas nos jardins das casas...

O resultado todos conhecemos: são os reservatórios vazios. Digo isso me atendo à esfera do município de São Paulo, sem mencionar a devastação da Amazônia, que afetou o ciclo de chuvas e contribuiu também para o quadro atual. Mas não vou falar do panorama macro porque é preciso destacar as responsabilidades e parar com o jogo de empurra. O município mesmo em plena crise segue não tomando para si as responsabilidades que lhe pertencem, negligenciando as áreas verdes da cidade. Temos exemplos disso estampados diariamente nos jornais: para mencionar apenas os casos mais recentes, temos o Parque Augusta, o Parque Vila Ema e o Parque dos Búfalos.

Mas a despeito da quase inanição do poder público, a sociedade civil não é cega. A Câmara discute água há dois meses, mas a sociedade civil já encabeça este debate há muito tempo, com um nível técnico elevadíssimo. Temos que parar de tentar inventar a roda e ouvir mais a sociedade civil. Um exemplo riquíssimo é a Aliança pela Água. A Aliança é uma rede, formada por 40 entidades da sociedade civil, que se reúnem desde outubro do ano passado, com o objetivo de alertar e elaborar propostas que ajudem o Estado de São Paulo a lidar com a crise e construir uma nova cultura de uso da água. Eles elaboraram um plano de emergência e responsabilidades políticas, com algumas ações imediatas e levaram essa carta ao executivo, mas não foram ouvidos. Esse plano que eles elaboraram pede que os órgãos públicos responsáveis assumam cinco compromissos:

1 – instalação de força tarefa para gestão de crise em âmbito estadual com participação de municípios e sociedade.

Dentro deste tema eles pedem em resumo:

• criação de comitês de trabalho por ações prioritárias com participação dos responsáveis por sua implantação e acompanhamento da sociedade civil;

• e implementação de medidas de gestão da oferta, como redução de pressão, rodízio e racionamento de água, de forma transparente e responsável;

2- plano articulado e coordenado de gerenciamento de oferta de água
Isso inclui:

• planejamento conjunto com prefeituras para apoiar elaboração de planos de contingência municipais;

• garantir serviços essenciais;

• logística para distribuição de água com planos de tráfego para circulação de caminhões pipa, realização de obras urgentes e reparos na rede de distribuição para minimizar vazamentos;

• fiscalizar qualidade e tabelar preço da água potável, como de caminhões pipa e água mineral. Este é um ponto muito relevante, porque se isso tivesse sido feito, a gente evitaria situações como esta que foi noticiada pelo jornal Diário de São Paulo, que fala de uma UPA (Unidade de Pronto Atendimento) no Jabaquara que deixou de atender pacientes por falta de água.

3 - comunicação institucional, com foco em educação, autonomia hídrica, engajamento e mídia.

4 - discutir e detalhar alternativas emergenciais e de médio prazo para garantir abastecimento de água.

Este item inclui:

• regulamentação e fiscalização do uso de águas não potáveis implantadas por prefeituras e estado;

• regulação e orientação para captação de água de chuva em diferentes escalas, como domiciliar e equipamentos públicos;

• organizar força-tarefa para a implementação de cisternas e caixas d'água, especialmente em bairros de baixa renda;

• regulamentação para o reuso de água com alto grau de poluição, como a armazenada em piscinões;

• fiscalização, análise e regulação do uso de água subterrânea, como poços e nascentes;

• verificar status das outorgas e estabelecer usos prioritários;

• identificação e monitoramento de nascentes em parques e outros locais que podem ser utilizados como fontes alternativas de água;

• convocar laboratórios de análise e realizar “mutirão” de testes de qualidade da água;

• divulgar os resultados de qualidade nos poços e nascentes para evitar usos indevidos da água;

• plano para ampliação da oferta de água em caráter emergencial ao longo de 2015, com descrição de custos, prazos e responsáveis pelas ações;

• amplo programa de redução e controle de perdas na rede, com identificação de locais com maior incidência de vazamentos e ações integradas com prefeituras, estabelecendo metas de eficiência no curto prazo (2015);

• ampliação do consumo de água de reuso por grandes consumidores: revisão da política tarifária e dos contratos de demanda firme (grandes consumidores) e negociação para migração para água de reuso;

• identificação e revisão de outorgas de indústrias e grandes produtores agropecuários.

5 - pacto social pelo desmatamento zero e recuperação das áreas de mananciais do estado de São Paulo.

A Câmara Municipal de São Paulo tem obrigação de encampar estas ideias, de ser um porta-voz das demandas que emergem da sociedade. A Câmara deve ser o centro da produção intelectual de políticas públicas para a cidade. Temos um orçamento expressivo, um corpo técnico qualificado. Deveríamos ser o celeiro de projetos inovadores na busca de soluções para os problemas da cidade, como é a questão da água. É aqui que o executivo deveria buscar inspiração e diretrizes.

A Câmara deve provocar a reflexão dos desafios do século vinte e um, reunir os melhores pensadores, indicar caminhos mais arrojados e avançados, que tratem a cidade de forma integrada e articulada com os diversos setores da sociedade e os demais municípios da região metropolitana.
É preciso se inspirar nas boas e criativas práticas internacionais e no que há de mais avançado na ciência e na tecnologia, nos movimentos sociais internacionais e no pensamento contemporâneo, que derrubou fronteiras geográficas e unificou o mundo, como um imenso organismo que funciona de forma sistêmica para atuar no curto e no longo prazo e realmente promover as transformações necessárias.

É imprescindível olhar para os alertas da natureza, para os desastres provocados pelos fenômenos climáticos intensos, para a escassez dos recursos naturais, para o impacto provocado pela ação humana irresponsável, o crescente desmatamento e o crescimento desordenado das cidades, para citar apenas alguns aspectos. É necessário mudar o paradigma da política tradicional que permanece estagnada numa polarização partidária estúpida, um jogo de empurra para fugir das responsabilidades e que cada vez mais inviabiliza o diálogo entre o legislativo, o executivo e a sociedade.

A produção legislativa atual não gera impactos reais na cidade. A atuação parlamentar individual que prioriza pequenos projetos para atender a interesses eleitoreiros, de varejo, tem representado o atraso desta instituição. Está mais do que na hora de a Câmara Municipal de São Paulo sair na frente como produção legislativa robusta, relevante e que efetivamente provoque os impactos positivos e as transformações de que a cidade tanto necessita para voltar a ser produtora de serviços ambientais e que se caracterize por uma gestão pública eficiente, moderna, transparente e sustentável.

Queria encerrar voltando a falar de água, com uma frase que tem sido muito repetida e que considero emblemática. Todo mundo tem falado de economizar água, mas o fato é que a água é como uma pessoa da família, não se economiza, se respeita.

Quero aproveitar a oportunidade para agradecer a todos os membros da Comissão de Saúde pelo trabalho conjunto realizado no ano de 2014. Saio com a sensação de que os resultados foram positivos e com a certeza de que a nova composição dará continuidade a este trabalho. Mas, não vamos abandonar o tema. Meu mandato acompanhou ontem a reunião promovida pelo vereador Gilberto Natalini, que tratou da organização do evento comemorativo do Dia Mundial da Saúde, que será em 7 de abril. O debate vai ter como objetivo discutir a qualidade do atendimento do SUS no município de São Paulo e pedir mais recursos para a saúde. Muito obrigado!”

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